Esta crítica faz parte da cobertura da 43ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, que ocorre entre 17 e 30 de outubro na cidade.
Merata Mita foi uma mulher fascinante. Além de ativista, vocálica quando se tratava, principalmente, das questões de gênero e dos direitos indígenas, foi a primeira mulher maori a dirigir um longa metragem na Nova Zelândia, década de 1970, isso enquanto criou seus seis filhos. Seu trabalho rompeu as barreiras nacionais e a tornou conhecida em todo o mundo. O documentário que carrega seu nome, Merata: Como Minha Mãe Descolonizou a Tela, foi dirigido por seu filho mais novo, Hepi Mita.
A narração em off do diretor estreante já avisa: todas as imagens dos filmes dela, para ele, são como memórias, porque estava lá quando elas foram registradas. Esse filme, por sua vez, se beneficia da enorme quantidade dessas imagens, sejam caseiras, sejam dos filmes realizados pela cineasta, a que o jovem teve acesso, tanto por trabalhar como arquivista como pela proximidade familiar.
Merata, em imagens de arquivo, fala do desejo por indigenizar as imagens e de não fugir de temas espinhosos do país. Para ela era necessário abordar assuntos que dividiam a Nova Zelândia, especialmente o racismo contra os maori e a brutalidade policial, uma vez que esses assuntos também dizem respeito não só a eles, mas a todo lugar que foi colonizado e tudo lugar colonizador, como um legado com o qual ainda é preciso lidar.
Justamente pelo enorme interesse que o trabalho da diretora desperta é que o documentário frustra, em certa medida, quem o assiste. Talvez por não ter o distanciamento que precisaria para lidar com o seu objeto, o diretor não deixa claro aspectos cronológicos e parte da carreira dela, especialmente em Hollywood, em que pouco contexto foi dado para o que ela estava realizando.
Por outro lado, naturaliza seu trabalho como se não fosse fruto de um esforço intelectual da parte dela e nascesse da forma como foi apresentado ao mundo. A maternidade, por sua vez, é enaltecida constantemente por ele e seus irmãos, que reforçam o fato de que ela gostava de ser uma mãe. Tal fato deve ser verdade, mas é colocado quase como contraponto a sua carreira, o que faz com que a proposta do filme por vezes pareça a auto-sabotagem.
Por sorte, Merata: Como Minha Mãe Descolonizou a Tela se vale de uma protagonista que desperta interesse o suficiente para se sobrepôr aos pequenos problemas de execução dele mesmo. É impossível não sair do filme querendo ver cada um dos filmes de Merata.
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