Assistido em 02/09/2013
Mergulhado nas cores de Almodóvar, Tudo Sobre Minha Mãe é um filme que exala intensidade. A estética por si só já é intensa: cenários coloridos e vibrantes e suas mulheres de vermelho. O filme aborda suas trajetórias e essas também são provocativas. A protagonista é Manuela (Cecilia Roth), uma mãe solteira com ótima relação com o filho, apaixonado pela escrita. Na noite do aniversário dele, vão assistir à encenação da peça Um Bonde Chamado Desejo, estrelada pela grande atriz Huma Rojo (Marisa Paredes). Huma não está interessada em receber fãs, em uma clara referência à personagem Margot de A Malvada (All About Eve, referenciado também no título do filme). Ao correr atrás do carro da atriz, o rapaz é atropelado e morre. Manuela resolve voltar para sua cidade de origem e procurar o pai de seu filho, a travesti Lola, que não sabia da existência dele. Lá conhece e passa a ajudar a freira Rosa (Penélope Cruz), que está grávida, e reencontra a amiga Agrado (Antonia San Juan), travesti que conheceu na época de convivência com Lola.
Todas as mulheres tem histórias fortes e momentos interessantes. Todas, em maior ou menor grau, estão atuando, fingindo alguma parte de suas vidas. Da irmã Rosa que mente para os pais para ocultar a gravidez, passando por Manuela, que lida com múltiplos papéis ao longo da película, à Agrado, que, como diria Judith Butler, faz do gênero uma performance. A dedicatória final deixa clara essa conexão com a atuação: “A Bette Davis, Gena Rowlands, Romy Schneider, a todas as atrizes que interpretaram atrizes, a todas as mulheres que atuam, aos homens que atuam e se tornam mulheres, a todas as pessoas que querem ser mães. À minha mãe”.
Quando Manuela passa a frequentar os camarins de Huma, cheguei a pensar que, como Eve no filme homenageado, ela se aproveitaria de suas fragilidades para de alguma forma se beneficiar ou se vingar. Almodóvar optou por não compor paralelo entre as duas obras de forma tão óbvia. Já a relação com Um Bonde Chamado Desejo fica clara quando Manuela menciona que a peça é parte de sua vida. Na história, Stella deixa o marido e vai embora com seu bebê, como ela havia feito dezoito anos antes. Alem disso, a icônica fala ” Seja você quem for, eu sempre dependi da bondade de estranhos” se reflete na vida de todas as personagens, que terminam por formar uma malha de apoio mútuo, mesmo sem se conhecerem verdadeiramente.
Com temas como maternidade, feminilidade, morte, gênero, AIDS, atuação e relacionamentos, Tudo Sobre Minha Mãe é um melodrama tocante e memorável, que fico feliz por ter conhecido apenas agora e não à época do lançamento.
Recomendo a quem tiver interesse o ótimo artigo de Sonia Maluf chamado Corporalidade e desejo: Tudo sobre minha mãe e o gênero na margem, em que aborda o fenômeno transgênero com foco na personagem Agrado e suas falas no filme. Interessantíssimo, vale a pena a leitura.
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