Assistidos em 07 e 08/02/2014.
Edifício Master e Um Dia na vida são ambos documentários do diretor Eduardo Coutinho, mas com abordagens quase que opostas.
Quando estava em minha graduação em Arquitetura, muito se frisou não só a importância, mas a necessidade de jamais esquecer do fator humano em relação à obra construída. Um edifício só existe por que pessoas o habitarão ou trabalharão nele. Ele existe para ser ocupado e só adquire significação através dessa ocupação. Edifício Master é um mergulho na vida dos moradores do prédio homônimo, localizado em Copacabana, no Rio de Janeiro. São 12 andares, 276 apartamentos e cerca de 500 moradores. Coutinho e sua equipe habitaram lá por algumas semanas para a realização do filme. Através de conversas com os moradores temos um vislumbre da vida que se manifesta nesse amontoado de tijolos: artistas aspirantes, artistas aposentados, ex-jogadores de futebol, prostitutas, estudantes, viúvos e viúvas. A diversidade de tipos enriquece o cotidiano. Com grande humanidade Coutinho desenterra histórias e pequenas vivências das suas personagens e com essa coleção nos apresenta um quadro emocionante e rico sobre o prédio. Pouco importa sua arquitetura, sua fachada: Edifício Master só é vivo por causa das pessoas.
Um Dia na Vida é um filme que nunca poderia ser comercializado: Coutinho gravou 19h de programação de televisão aberta brasileira, do começo da manhã até a madrugada e editou-a em um vídeo de pouco mais de uma hora e meia de duração, o que cria problemas de direitos autorais. O filme não possui qualquer tipo de narrador ou apresentação de fatos: o que você vê é simplesmente uma sequência de trechos dos programas de TV, que vão de novelas de pouca qualidade a jornalísticos manipuladores, passando por noticiários policiais e tele-evangelismo. Vários aspectos do filme chamam atenção. Em primeiro lugar a baixa qualidade da programação, especialmente levando-se em conta que a concessão de rádio e TV é pública e deveria atender a interesses comunitários. Depois, ainda levando-se em conta o aspecto público da concessão, a maneira como as emissoras exibem diversas formas de preconceitos (racismo, classismo, machismo, etc), sem preocupações maiores em relação a isso, prejudicando os próprios cidadãos. A falta de conteúdo crítico e educativo é patente e o entretenimento vazio, o voyeurismo e o incentivo ao consumismo (mesmo para as faixas etárias mais baixas) se faz presente em todos os horários. É interessante como esquece-se que se está assistindo um documentário: em certos momentos parece que estamos com a televisão ligada naquela programação e chega a causar certo desconforto a (baixa) qualidade do que se vê. Vencer o tempo de duração do filme é uma tarefa extenuante. O que temos aqui é a desumanização do expectador, que encolhe diante do que vê e torna-se impotente, sem poder de controle sobre o que o televisor projeta em sua direção. A única opção é o botão de desligar o aparelho. Essa é a programação que a maioria absoluta da população brasileira tem acesso diariamente, (des)educando e provocando escapismos.
Entre mostrar a vida que percorre os corredores e cômodos de um edifício e a letargia que nos consome ao sentarmos em frente a uma TV, Eduardo Coutinho produz documentários que são sobre o ser humano. Nós estamos em primeiro plano nessa obra e somos, ao mesmo tempo, a chave para o entendimento do que se vê.