Estante da Sala

Brooklyn (2015)

Brooklyn é uma fábula sobre migração e a busca por um lugar para si. Eilis (Saoirse Ronan) é uma jovem irlandesa de cidade pequena que, com a ajuda daqueles que a rodeiam, migra para os Estados Unidos na década de 1950 e se estabelece no Brooklyn. Padre Flood (Jim Broadbent) havia, com antecedência, conseguido uma vaga para que ela morasse na pensão da Sra. Keogh (Julie Walters) e um emprego em uma loja, sob o olhar vigilante e cuidadoso da Srta. Fortini (Jessica Parré). O filme é dirigido por John Crowley e conta com roteiro de Nick Hornby, adaptado do romance de Colm Tóibín.

No universo do filme não há conflitos entre os imigrantes e a população local, ou pelo menos eles não são o foco da trama. O que importa aqui é a sensação que Eilis tem de não fazer parte desse local e a saudade de algo que lhe fosse familiar. Esse algo começa a se delinear quando conhece Tony, (Emory Cohen) um charmoso jovem ítalo-americano que mostra a cidade a ela e a apresenta a família. Não é que ela precise de um romance para ser completa: é o companheirismo e apoio que a ajudam. O filme descortina uma Nova York bastante branca e não há espaço para explorar as diferenças. O único momento em que isso perpassa a trama é quando o irmão mais novo de Tony, Frankie (James DiGiacomo) fala sobre como não gosta de irlandeses por conta de tensões e hierarquias entre os imigrantes. A fala é logo recriminada pelos demais e a criança se cala.

Acontecimentos não previstos fazem com que Eilis precise retornar à Irlanda, onde conhece Jim Farrell (Domhnall Gleeson) Os interesses amorosos de Eilis podem ser entendidos de forma alegórica, pois representam a ligação dela com cada país e as perspectivas que lhe são oferecidas. Jim é a familiaridade de sua pátria: ao seu lado, Eilis tem a tradição, a estabilidade financeira e, para o bem ou para o mal, os velhos costumes de seu local de origem. Já Tony, que trabalha como encanador e planeja ter uma empresa de construção com seus irmãos, representa a novidade, o começar do zero e se adaptar a pessoas, empregos e costumes novos para recriar sua vida.

A trajetória da personagem é externada através do design de produção de François Séguin, que cria um mundo quase onírico, com uma paleta de cores em tons pastel que trata de estabelecer o fabulesco da trama. Os elementos de época são facilmente reconhecidos, mas a reverência com que são dispostos os distanciam do papel de retrato fiel de uma época. O figurino de Odile Dicks-Mireaux, por sua vez, diferencia três momentos da personagem, marcados também por aqueles ao seu redor: o começo na Irlanda, os Estados Unidos e o retorno ao seu país. É interessante notar como a protagonista se destaca entre os demais no momento em que se despede de sua família, já no navio.

Saoirse Ronan é uma atriz que sempre apresentou boas atuações. Já em Desejo e Reparação (2007), com apenas treze anos, roubou para si as atenções no prólogo, parte do qual participa. Aqui, compõe uma personagem doce, mas decidida e consegue gerar empatia mesmo quando questionamos suas ações. Utiliza seus olhos de forma muito expressiva. Emory Cohen se sai bem em emular um jovem Marlon Brando, o que é surpreendente, tendo em vista que poucos anos atrás interpretou de forma robótica e irritante o filho da protagonista encarnada por Debra Messing no seriado Smash. Já Domhnall Gleeson, aparece apenas no terceiro ato e está bem no papel, embora merecesse mais espaço e profundidade.

Um lar é mais que uma sensação do que algo físico. Uma casa pode ser um lar, mas é possível ter um lar sem ter uma casa. Estou na minha sexta morada em treze anos e aprendi a lidar com as mudanças: no início você leva sua vida em algumas caixas, mas com o tempo começa a perceber que não depende do conteúdo delas. Chega um momento em que você se dá conta que não tem mais raízes e no começo isso é uma constatação triste. Até que percebe que assim está livre para viver plenamente onde quer que estiver. Brooklyn é uma bela fábula, que relata de forma delicada a busca por um lugar que seja seu, que seja um lar e que traga, por fim, senso de pertencimento.

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