Mais um belo filme nacional estrelado por Irandhir Santos, Permanência tem como trama a chegada do fotógrafo pernambucano Ivo, por ele interpretado, à cidade de São Paulo, onde vai montar sua primeira exposição individual. Para isso fica hospedado na casa de Rita (Rita Carelli), sua ex-namorada, que agora já está casada com outro homem, Mauro (Sílvio Restiffe).
Em um primeiro momento o que se percebe é o contraponto entre a visão do protagonista sobre a grande metrópole e, em troca, a visão dos moradores desta sobre sua terra e sua pessoa. O estranhamento é mútuo e reflete, em parte, a própria alienação de relações que ele encontra na cidade. O recorte de tempo que o filme cobre marca o retorno ao contato entre os dois ex-amantes e funciona como uma maneira de refletir sobre as expectativas e o inevitável desgaste dos relacionamentos. Ivo e Rita não possuem mais assuntos em comum: apenas um imenso silêncio que se preenche por um desejo quase palpável, mas também por uma melancolia que reflete o passado e o presente. As relações que vem da cidade são fugazes, evaporam-se pela manhã.
Nada mais adequado que o destaque dado à pintura O Quarto de Hotel, de Edward Hopper, pendurada no corredor do apartamento de Ivo e Rita. Seminua, a retratada está sozinha em um quarto estranho e impessoal e é o retrato pungente da solidão e fragilidade de um viajante, que ecoa as vivências do protagonista.
Talvez por isso o título do filme seja tão interessante: não são os relacionamentos que permanecem, mas a arte. A impressão de fotos e outros materiais gráficos, bem como o maquinário responsável por elas estão constantemente em foco, buscando uma poesia visual com essa ideia. Além disso, é a câmera fotográfica, ainda analógica, que registra as maiores verdades. Tudo passa pelo filtro de lentes e revelações.
Mas não são só essas impressões que marcam a história: os aromas também a permeiam, ainda que impossíveis de serem transmitidos por meio audiovisual. O café italiano recém passado, o vinho argentino com buquê demais, a calcinha tirada da gaveta do armário: todos esses cheiros estão emaranhados no sentido e nos sentidos da narrativa.
O filme conta com Leonardo Lacca, preparador de elenco de Tatuagem, em seu primeiro trabalho de direção. Não deixa de ser curioso, pois o elemento mais incômodo é atuação monotônica da atriz principal. Mas esse defeito é compensado pela atuação competente de Irandhir Santos, pelo ritmo que se constrói de maneira lenta mas adequada à narrativa e pelas cenas compostas e enquadradas de maneira bonita, todos compondo uma obra bela e que, após alguma reflexão, cresce na memória.
Um filme a partir de um quadro… inspirador Isa 🙂